Olá,
Às vezes, depois de as coisas existirem, deixamos de nos lembrar de como o mundo era antes de elas aparecerem. Como era a vida antes do telemóvel? Como fazíamos para combinar coisas? Como é que nos orientávamos numa viagem, sem GPS? Como interagíamos com os meus amigos, antes das redes sociais? Como era a vida antes da água canalizada e da luz (se quisermos recuar um pouco mais, mas recordado que a esmagadora maioria da história da humanidade aconteceu, precisamente, nessas condições)?
Levanto estas questões para o pôr a pensar na sua atividade profissional. Como era, antes de alguns acontecimentos terem ocorrido e de algumas pessoas terem aparecido?
Como talvez saiba, apesar de não trabalhar como fisioterapeuta há muitos anos, sou fisioterapeuta de formação. Aliás, fará este ano 20 anos que entrei no curso de fisioterapia e, acredite, em 20 anos muitas coisas mudaram.
Como era a fisioterapia antes de haver licenciatura em fisioterapia? Como era a fisioterapia quando havia só um ou dois fisioterapeutas que eram Mestres e não havia nenhum Doutor? Como era a fisioterapia antes de aparecerem os “gabinetes” ou, sobretudo, antes dos “gabinetes” assumirem a expressão que hoje assumem? Como eram as coisas antes de haver o reconhecimento social dos fisioterapeutas que, para todos os efeitos, já vai havendo hoje?
Como era a realidade antes de haver democratização do acesso a formação avançada, com o surgimento da Bwizer e de outras empresas do género? Saberão as pessoas, sobretudo as mais novas, que se contavam pelos dedos de uma mão as formações disponíveis não há muitos anos, e que eram dadas sempre pelos mesmos? Como era a possibilidade de evolução académica antes de surgirem os mestrados, sobretudo os mestrados específicos em fisioterapia?
Como vê, há momentos que marcam mudanças. Momentos que, muitas vezes, são o corolário de processos longos, ainda assim, momentos.
Importa ter noção, portanto, que a história se faz de momentos mais ou menos disruptivos, uns para a frente e, outros, para trás. Sim, para trás! Há momentos que nos levam para uma realidade pior do que a realidade atual e, muitas vezes, ao vivermos a vida de “hoje”, pensamos que o “amanhã melhor” é já um dado adquirido. Não é! Aquilo que temos hoje, pouco nos garante para amanhã. É por isso que, pessoal e coletivamente, há que ir construindo a história a cada dia.
Uma das pessoas que tem dado o seu contributo para a criação da história é o Carlos Moreira, jovem fisioterapeuta criador do podcast “A Hora do Fisio”. E, lá está, agora que alguém lançou um podcast na área da fisioterapia em Portugal, talvez até já pareça um projeto óbvio, simples ou, no mínimo, pouco merecedor de algum destaque. O que convém não esquecer é que, antes dele, não havia nenhum. É certo que depois de alguém criar algo novo, copiar é mais fácil, e ainda bem que assim é, mas, não duvidemos, sem aquele trabalho original, a história seria outra.
Os fisioterapeutas portugueses, desde logo os mais novos, poderão não ter noção de quanto valem este tipo de iniciativas, a que se juntam outras, como o próprio Fisioterapeuta Empreendedor, passando a imodéstia, bem como blogs, tertúlias e palestras, e todos os outros momentos de partilha, relevante e gratuita, que hoje existem. É fácil pensar que essa sempre foi a realidade e que essa realidade, sempre existirá. Não, nem sempre foi assim e não, nada garante que assim seja sempre, se não apoiarmos estas iniciativas.
Se se viajasse no tempo e se dissesse a um jovem fisioterapeuta de há 20 ou 30 anos atrás que haveria um tempo com o grau de partilha gratuita que há hoje, pareceria a Utopia. Hoje, é fácil minimizar esta realidade.
Eu não quero cair na tentação de achar que tudo é trivial, fácil e menor. E, por isso, na hora em que o Carlos Moreira anuncia o fim do seu podcast, queria aqui homenagear o seu projeto e a sua atitude disruptiva. E uma boa forma de se juntarem a mim nesta homenagem é ouvirem os seus episódios, desde logo o último, com um extraordinário fisioterapeuta e pensador da fisioterapia, o Tiago Freitas.
Poderá talvez ser também uma homenagem bonita, e bem merecida, deixar um comentário num dos seus posts no Facebook, desde logo o relativo ao seu último episódio.
Quando ao mais, Carlos, ficamos à espera do teu próximo projeto!
(27/07/2018)
CV: Hugo Belchior é fisioterapeuta, no entanto cedo percebeu que área que verdadeiramente o fascinava e motivava era a Gestão. Atualmente, lidera dois projetos empresariais próprios e outros projetos ligados ao empreendedorismo e gestão.